Hoje celebra-se o Dia Internacional das Mulheres pela Paz e pelo Desarmamento. A sua comemoração teve origem no início dos anos oitenta, na Europa, quando centenas de mulheres se organizaram contra as armas nucleares e a corrida armamentista. Em 2010, e por todo Mundo, a Marcha Mundial das Mulheres continua a lutar pelo fim imediato dos conflitos armados e do uso do corpo das mulheres como terreno de guerra. Estamos a marchar para denunciar os interesses económicos que estão por detrás de inúmeros conflitos armados e o envolvimento das grandes potências mundiais em guerras que perduram em tantos países e regiões do Mundo.
Vivemos num mundo cada vez mais militarizado, como se pode comprovar por um crescimento real das despesas militares mundiais de 45% nos últimos dez anos. Entre 2006 e 2007, o aumento médio dos orçamentos militares nacionais foi de 6%. Em 2005, os Estados Unidos mantinham 737 bases militares activas em outros países, com um contingente de 2 500 000 de pessoas e, em 2007, as suas despesas militares representavam 45% do total da despesa mundial na área da defesa. Por outro lado, a guerra sofreu alterações importantes e hoje em dia é cada vez mais feita por mercenários privados: de um total de 330 000 soldados, que estavam no Iraque em 2007, 180 000 mil são membros de empresas de segurança privada.
No entanto, esta crescente militarização da vida e da sociedade é também visível na disseminação civil de armas pequenas e ligeiras. De acordo com dados do Small Arms Survey (2008), as armas de fogo vitimam, diariamente, em todo o mundo, cerca de mil pessoas. Dessas mortes, apenas 25% se registam em contextos de guerra ou conflito armado, sendo que a maioria destas armas se encontram em posse civil, superando aquelas sob controlo do Estado e forças de segurança.
Em Portugal, calcula-se que existam 1,4 milhões de armas de fogo legais em posse civil, na sua maioria armas de caça. As estimativas sobre a dimensão do mercado ilegal apontam para a existência de entre 500 mil e 1 milhão de armas. Entre 2003 e 2008, de acordo com dados do Ministério da Saúde e Polícia Judiciária, 437 pessoas foram vítimas mortais de armas de fogo no nosso país, sendo que 1619 ficaram feridas gravemente. Dados oficiais sobre violência doméstica armada são, contudo, escassos.
A ausência de dados e análises sobre esta realidade deve-se ao facto de, em Portugal, como em todo o mundo, a investigação e intervenção nos domínios da violência urbana e violência contra as mulheres permanecerem separadas. É como se também o fenómeno da violência estivesse dividido em dois pólos independentes: o espaço público, da violência de homens contra homens - aqueles que mais matam e morrem em resultado de armas de fogo – e a esfera doméstica, lugar, por excelência, da vitimação feminina.
Segundo dados do Observatório das Mulheres Assassinadas da UMAR, desde 2004 morreram no nosso país 200 mulheres vítimas de violência doméstica. Destas, 40% foram assassinadas por armas de fogo e 17% por armas brancas, sendo que em 40 mortes não há registo da causa de morte. É importante recordar, todavia, que estes dados captam apenas a realidade da vitimação directa de mulheres com armas de fogo, negligenciando o elemento intimidatório das armas de fogo e outros impactos da violência armada.
As mulheres sempre sofreram os males da guerra, psicologicamente, socialmente, física e economicamente. As mulheres e os seus corpos foram considerados ora como despojo de guerra, ora como moeda de troca. São vistas como o repouso do guerreiro, o seu corpo identificado como solo inimigo e, por isso, um campo de batalha. Guerra, conflitos e militarização são expressões da violência tornada natural pelos sistemas capitalista e patriarcal e os meios utilizados por estes para manterem o seu domínio. Mais do que isso, a militarização reflecte a divisão dos papéis de género: o conceito de masculinidade é associado à violência e às armas, o que leva à ideia de que as mulheres necessitam de protecção dos homens e das armas.
A Marcha Mundial das Mulheres bate-se e defende a vida e luta pela transformação da sociedade patriarcal, capitalista e militarizada em que vivemos, numa outra formada por pessoas livres e baseada nos valores de Paz, Justiça, Solidariedade, Liberdade e Igualdade. Estaremos em marcha até que as mulheres sejam reconhecidas e valorizadas como protagonistas dos processos de paz, reconciliação e reconstrução e de manutenção activa da paz nos seus países.
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